domingo, 13 de setembro de 2015

[Opinião] Não precisamos de novos sistemas de RPG

A criação um RPG é o sonho de muitos RPGistas. Várias pessoas tem uma ideia legal de cenário, e se aventuram na criação de um sistema para esse cenário. Passam anos criando o sistema, fazendo testes, procurando ajuda. Muitos correm o risco de terminar com um sistema falho que compromete o seu jogo. Esquecem que tudo começou com uma ideia de cenário, e acabam gastando todo o tempo que poderiam dispender para tornar o seu cenário em algo fantástico, desenvolvendo um sistema. Sem necessidade.

Nesse artigo eu pretendo tentar convencer as pessoas que tem uma ideia legal de cenário a desistirem de criar seu sistema, apresentando brevemente dois sistemas que se encaixam em praticamente em qualquer clima de jogo que eles poderiam desejar para o seu cenário: o Fate e o Savage Worlds. Existem outras opções de sistemas livres e/ou acessíveis que podem ser usados, mas esses dois são as minhas indicações pela facilidade, qualidade e suporte da comunidade e das editoras.








Ambos são sistemas genéricos, fáceis de adaptar para qualquer cenário. Existem características que os tornam melhores para um ou outro tipo de jogo.

Savage Worlds

Se o seu cenário tem uma cara mais tradicional, e você deseja usar grid, miniaturas, regras detalhadas de combate, magia, etc., é para Savage Worlds que você deve escrever o seu cenário. Já existem compêndios de Fantasia, Horror, Superpoderes e Sci-Fi (esse ainda não publicado em português) que servem como auxiliares para a criação de cenários. Savage Worlds é um sistema focado em aventura e combates rápidos, o que não impede que o cenário tenha um foco mais narrativo e nos dramas dos personagens. Pelo contrário, como você não precisa perder tanto tempo decorando regras uma vez que elas são intuitivas, dá para se focar melhor na história.
Qualquer um pode escrever cenários e adaptações para Savage Worlds e distribuir gratuitamente usando o selo de fã e citando as instruções descritas no site da Pinnacle. Também é possível publicar um cenário licenciado oficialmente, e com isso, vendê-lo. No Brasil, é a Retropunk Publicações, que avalia se o cenário possui os padrões de qualidade exigidos pela Pinnacle e faz o processo de licenciamento.

Fate

Esse é o sistema caso o seu cenário seja mais focado na narração e, sem uso de miniaturas, e aproveitando o ambiente e as ações do personagem para gerar "bônus" e situações de jogo. É a opção se você quiser fugir dos sistemas "tradicionais". Em Fate, a criação de personagens é descritiva, e o jogador é capaz de tornar-se agente criativo dentro do jogo. O sistema é robusto e de altíssima qualidade, e existe em duas versões: o Acelerado com regras mais rápidas e intuitivas e excelente para iniciantes, e o Básico com regras mais detalhadas.
O Fate possui um documento OGL (Open Game Licensing) sob Creative Commons CC - By, que permite que outros distribuam, remixem, adaptem e criem a partir do seu trabalho, mesmo para fins comerciais, desde que lhe atribuam o devido crédito pela criação original. Você não precisa de autorização de ninguém para vender seus Cenários usando o sistema Fate, e não é obrigado a manter a mesma licença sob suas criações (ou seja, o jogo é seu e não pode ser modificado por outros sem a sua autorização). Além disso, existe o licenciamento Powered by Fate. Você não pode usar os logos originais do Fate Core e do Fate Acelerado em seus jogos, mas pode usar esse. Mais informações sobre o licenciamento do Fate podem ser obtidas com a editora Solar, que trouxe oficialmente o Fate para o Brasil.


Vantagens adicionais

Além das vantagens óbvias de criar cenários para um sistemas que já foi testado, aprovado, e existe em português, há uma outra coisa que se deve considerar: Fate e Savage Worlds são sistemas com uma base boa de jogadores no Brasil, reunidos em comunidades (grupos de Facebook) onde há troca de experiências e onde dúvidas podem ser sanadas. Os representantes da Solar e da Retropunk são bastante acessíveis e dispostos a ajudar. Eles são pessoas que trouxeram esses jogos para o Brasil por amor ao RPG, e não visando lucro. E isso faz toda a diferença com relação ao suporte dado a quem estiver desenvolvendo um cenário dentro desses sistemas. Então, todo o tempo que você perderia desenvolvendo regras para o sistema de jogo, poderá se focar na criação do cenário. Todos os problemas de regras que você ia ter de resolver sozinho batendo cabeça até encontrar uma solução, pode pedir ajuda a pessoas que já conhecem o sistema. E, quando o seu jogo sair, já vai existir uma comunidade fã do sistema, ávida para conhecer o seu cenário, ao invés de você ter de convencer as pessoas a apostar num sistema novo.

Criar um jogo para esses sistemas não requer anos e mais anos de trabalho e elimina dúvidas sobre "será que vai dar certo?". Lembre-se, jogos de RPG são em geral conhecidos pelos seus cenários. O sistema é apenas a ferramenta usada para o seu jogo. Deve combinar com ele, mas não deve definí-lo.

Quebrando o tabu sobre a importância do sistema:

D&D - D&D é certamente o jogo de RPG mais conhecido e importante que existe. D&D é um jogo com temática medieval, raças, monstros, características, e um sistema com várias edições. Você não define D&D pelo sistema que ele usa, e sim pelo cenário, apesar do mesmo ser simples e muito customizável, além de ter livros separados para vários cenários, todos com características em comum para D&D. Espera-se que todos os cenários usando a OGL de D&D tenham mais ou menos a mesma cara do D&D, pois é a temática que o define como tal. GURPS é um sistema. Ninguém fala somente "vou mestrar GURPS, quem está a fim?". As pessoas falam "Vou mestrar GURPS Supers baseado em Marvel" . E Supers é um subconjunto de regras dentro do GURPS, sendo Marvel o cenário, no caso. Há também os cenários oficiais de Supers. O Supers publicado pela Devir tem como cenário o Cartas Selvagens. O Illuminati é um cenário, e por aí vai.

A maioria dos jogos conhecidos tem o nome do cenário, sendo o sistema, próprio ou não, um auxiliar para o desenrolar do jogo. Vampiro a Máscara, Numenera, Lenda dos Cinco Anéis, Accursed, Scion, Chamado de Cthulhu. Conhecemos esses jogos pelo nome do cenário, e não do sistema. Em alguns o sistema é bem ruinzinho até, mas o cenário é tão bom que compensa os problemas do sistema. Muitos usam sistemas também usados em outros jogos de outros nomes. Faça o seu RPG ser lembrado pelo cenário. Coloque a sua energia criativa nisso. Desenvolver um sistema para colocar sua ideia de cenário funcionando como jogo não é produtivo. É desperdício de potencial, de tempo e de pesquisa (sim, você vai ter de estudar teoria de jogos e um monte de coisa). Não vai ser pelo sistema que o seu jogo será conhecido, mas usar um sistema robusto pode - e vai - influenciar o público que vai apostar em seu jogo, seja ele pago ou gratuito. O sistema importa sim, e é por isso que eu recomendo que você use um sistema robusto e já com uma base de fãs, que funcione bem com o seu cenário.

Não precisamos de novos sistemas de RPG. Estamos ávidos para conhecer o seu cenário, que você não conseguiu desenvolver ainda porque está perdendo tempo com um sistema.


Grupos de Facebook:
Fate: https://www.facebook.com/groups/faterpgbrasil/?fref=ts
Savage Worlds: https://www.facebook.com/groups/217855645016763/?fref=ts


Resumos dos sistemas aqui no Tralhas:
Fate Acelerado: http://gracilariopsis.blogspot.com.br/2015/02/fae-fate-acelerado-resumo.html
Savage Worlds: http://gracilariopsis.blogspot.com.br/2013/07/savage-worlds-resumo-das-regras.html

7 comentários:

  1. Gostei do Post, Graci.
    Não sei se concordo com tudo, mas realmente me fez pensar...

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  2. Concordo e não concordo ao mesmo tempo por alguns motivos que eu já penso faz tempo.

    Gosto da ideia de criar sistemas porque simplesmente me agrada. SEI que já existem jogos consolidados no mercado que podem emular todo tipo de cenário e que a maioria dos sistemas menores lançados (sem generalizar) acabam parecendo uma mistura de 2 ou 3 dos jogos mais famosos em uma quimera esquisita.

    Mas também acredito que ainda assim com todos esses jogos nós SEMPRE precisamos de coisas novas, independe da qualidade o mercado tem que ta sempre tentando. O Fate ou Savage World surgiu em um mundo onde muitos diriam que D20 e GURPS resolveriam qualquer cenário e mesmo assim eles conseguiram seus fãs merecidamente.

    Mas sim, um ponto que concordo totalmente é que se o autor tem uma ideia pra cenário, que se foque no CENÁRIO, esquece sistema e vai com tudo no que interessa. Se precisar criar regras ou um sistema próprio no futuro (Como em Reinos de ferro) que faça depois, mas comece criando o que deve ser feito e teste-o loucamente até chegar na etapa de gerar regras e toda uma mecânica nova sem nem saber se a história dará certo.

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  3. Ponto de vista interessante. Mas como eu foco em sistemas ultra simples (3:16 e os meus), então um cenário inovador (isso não consigo...) e um sistema realmente mínimo e simples, me serve.

    Só quero viver a história, mínimas regras, personagens em dois minutos, matemática mínima, bom senso do narrador.

    Mas a postagem gera reflexão.

    Em 2012 escrevi algo um pouco distante do que você propõe aqui, mas aproximado:
    http://rpgsimples.blogspot.com.br/2012/01/mecanica-nao-e-importante-concentre-se.html

    Gilson

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  4. Super de acordo Graci, criar sistema é trabalho de estatístico. Você precisa ver variantes de resultados de lance de dados de acordo com o modelo, criar uma progressão proporcional e dosar vantagens ou desvantagens (quando elas existem, quase sempre) de modo equilibrado. Criar um sistema de RPG é muito mais transpiração do que criação. É matemática! =)

    Obs: Criar cenários também envolve muita transpiração!

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  5. Muito bom. Concordo, contudo vez ou outra é bom um sistema novo, como por exemplo o FATE. Realmente já existem muitos sistemas bons.
    Eu já amava o 3D&T Alpha, o STAR WARS FFG e agora estou deslumbrado com o FATE.
    RPG é bom demais. Parabéns pela matéria!

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  6. Cara como eu discordo dessa ideia, eu acho que precisamos é de ainda mais criadores de sistema, apesar de achar que muita gente não tem a habilidade de criar algo mais original, deixa o cara tentar!

    Imagina, se na época do d20 licença aberta o povo tivesse caído nessa armadilha! E olha que um monte caiu, hoje não teríamos nem Fate e nem Savage Worlds, ou Cortex Plus! Apesar de achar que estes sistemas são excelentes bases para vários cenários, eu por exemplo não consigo criar um sistema do zero, eu fico curioso ao ver um sistema original.

    Resumindo, não é por que o sistema é autoral que ele será bom, mas quem sabe pode sair coisa boa dali.

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