segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Dicas para ser bem sucedido em jogos one-shot


One-shot são aventuras curtas, com começo, meio e fim, desenhadas para ocorrerem em uma única sessão, normalmente algo entre 4 e 6 horas de jogo. Se uma campanha pode ser definida como um romance ou uma grande saga, o one-shot é um conto.

Quem está acostumado a ler contos sabe que um bom conto vai ficar na sua cabeça para sempre. O one-shot não deve ser pensado como “uma aventurinha pra passar o tempo”, e sim como algo memorável, no mesmo nível das melhores campanhas. Se a campanha é “Game of Thrones”, o one-shot é “Call of Cthulhu”, por exemplo.


Isso nos leva ao próximo ponto: one-shot é uma ótima oportunidade para experimentar sem medo de errar, pois se for um fracasso, não irá comprometer uma campanha. É o momento para colocar os personagens de jogador cara-a-cara com uma experiência incomum, cataclísmica ou que coloque suas vidas em risco, ou mesmo algo que não exista no cenário escolhido, e que você tenha receio de que possa vir a comprometer o cenário caso se tratasse de campanha. É o momento também para experimentar um jogo novo, e descobrir se você e os jogadores vão se adaptar a ele. E, finalmente, é a oportunidade ideal para conhecer novos jogadores, uma vez que dificilmente você irá querer em suas campanhas jogadores desconhecidos, sem antes saber o estilo de jogo deles (e se esse estilo combina com o seu jogo e com os demais jogadores), bem como o seu comprometimento, personalidade, tipo de personagem que ele gosta, etc. Conhecer novos jogadores inclui, especialmente, mestrar para iniciantes. Você não vai querer criar uma campanha para iniciantes. Narre alguns one-shot para eles e só depois parta para uma campanha.

Seguem algumas dicas selecionadas por mim, a partir da minha experiência pessoal e também com base em um monte de material que eu já li na internet ao longo desses anos, para ser bem sucedido narrando one shot.

material para uma aventura one-shot


A escolha do sistema e cenário

Muitas vezes, o one-shot é uma desculpa para narrar um sistema e cenário novo, que acabamos de conhecer. Mas quando não é esse o motivo, existem cenários e sistemas que são escolhas melhores. Prefira sistemas fáceis de “pegar” com uma explicação rápida, e cenários que não sejam completamente alienígenas aos jogadores (exceto nos casos em que a estranheza faça parte do jogo, e ele seja ao estilo “Alice no País das Maravilhas”). Tenha em mente que por ser uma aventura curta, o foco do jogo não será a evolução do personagem, então se você escolher um sistema que tem esse foco, ignore isso no seu jogo.


A criação de personagens

A não ser que o cenário seja completamente familiar aos jogadores e que a ficha demore menos de 10 minutos para fazer - incluindo a criação conceitual do personagem e o preenchimento - prefira levar personagens prontos. Um grande erro é achar que uma ficha é um personagem pronto. É claro que você não precisa criar um grande prelúdio, o nome do personagem, nem definir gênero, gostos, etc. Para ajudar os jogadores a imergirem em seus personagens, você pode deixar esses aspectos para que eles criem, e também pode deixar alguns pontos de criação de ficha para que eles personalizem o personagem. Mas junto com a ficha você precisa definir algumas coisas sobre o personagem. Se os jogadores não conhecem o cenário e o sistema, você vai precisar incluir um anexo explicando quem é esse personagem, no que ele é bom e se destaca, quais são seus pontos fracos, e um resumo de suas habilidades, poderes, etc. Faça o máximo para não obrigar um jogador a ter de olhar no livro no meio da aventura. Mas se não for possível, por exemplo no caso de ter de consultar uma tabela para determinado efeito, deixe anotado na ficha o número da página a ser olhada.

Olhe para a aventura que pretende narrar. Crie personagens interessantes para ela. Se a aventura funcionar melhor com personagens que se conhecem previamente, estabeleça esses vínculos entre eles. Só não estabeleça vínculos se a premissa do jogo for justamente reunir numa mesma situação personagens que não se conhecem.

Olhe para os seus jogadores, caso já os conheça. Crie personagens interessantes para eles. Pense num jogador e diga: essa pessoa adoraria jogar com um personagem de determinado tipo. Depois de criar personagens que seriam perfeitos na mão de cada um de seus jogadores, veja o que está faltando para que o grupo tenha o máximo de chance de sucesso em completar a aventura, e crie uns 2 ou 3 personagens a mais do que o número de jogadores convidados para a mesa. Ninguém vai sentir aquela sensação de “vou ter de jogar com o que sobrou”, e você também aprenderá um pouco mais sobre as preferências dos seus jogadores se um ou mais deles rejeitarem o personagem que você fez pensando nele.

Ajude o jogador a entender o personagem escolhido. Tire suas dúvidas, fale mais sobre ele se as coisas estiverem nebulosas.


A definição de limites para o jogo one-shot

Se em uma campanha o foco é o desenvolvimento dos personagens de jogador, suas personalidades, sua interação com o mundo de jogo e com a aventura em si, no one-shot o foco é completar a aventura naquelas poucas horas da sessão de jogo. Infelizmente, não há tempo para procurar aliados em busca de ajuda, não há tempo para interpretar a natureza galanteadora do seu personagem, não há tempo para aprender uma coisa nova. Mas os jogadores irão, cedo ou tarde, tentar fazer isso, e se o foco do jogo não for muito bem delimitado, os “desvios” vão acabar fazendo com que a aventura não seja concluída dentro do limite de tempo.

Faça uma aventura simples, mas marcante

O começo do jogo deve ser rápido e descomplicado. Os laços anteriores entre os personagens podem funcionar como gancho para que eles tenham desejado, de antemão, investigar alguma coisa, ou que tenham sido colocados juntos em uma determinada situação. Se os personagens não se conhecem, o acaso ou o destino os colocou todos ali. Não faça muitas perguntas, nem dê tempo aos jogadores para pensarem em desculpas para não estarem ali, naquele momento.

A aventura tem de ser rápida, com começo, meio e fim, e clara o suficiente para que os personagens a completem de modo praticamente linear. Muita gente reclama que aventuras lineares são ruins, que não dão margem para inovações, que inibem a liberdade dos jogadores. Mas em 4 horas de jogo, não dá tempo para aventuras não lineares... o máximo que você pode fazer é elaborar a aventura já prevendo umas duas ou três linhas de ação que levem todas a um mesmo clímax, mas isso não deixa de ser algo linear: não haverá tempo para explorar todas as possibilidades. Lembre-se que linear não é sinônimo de ruim.

Como já citado acima, aproveite a oportunidade para proporcionar experiências incomuns. Evite os temas previsíveis, ou faça um tema aparentemente previsível com alguma grande surpresa. O one-shot é a chance para experimentar e inovar.

Uma coisa que Rastro de Cthulhu me ensinou é que o foco do jogo não deve ser “obter as pistas”, e sim o que fazer com elas. Você não vai querer que o jogo fique empatado por causa de uma falha na rolagem em entender o que está acontecendo, então faça essa rolagem ser fácil, e tenha um plano B (como um NPC, por exemplo) pronto para dar um empurrãozinho na hora que os jogadores empacarem.

Preste atenção ao número de cenas, e ao tempo que elas irão demorar para acontecer. Sempre prepare a aventura pensando que ela durará uma hora a menos do que o tempo total que você tem para narrá-la, porque a previsão de tempo sempre é subestimada.

E por último, a experiência me faz afirmar que a vitória é sempre mais divertida que a derrota. Então, se vai narrar one-shot, crie condições para que os personagens saiam vitoriosos do conflito. 

Estabeleça os limites que irão manter os personagens dentro do foco da aventura

Há algumas formas de impor limites ao seu jogo, para evitar que os personagens se desviem dos objetivos. Você pode impor um limite de tempo. Todos estão numa corrida contra o relógio para impedir que alguma coisa aconteça, ou para fazer que algo aconteça e impedir o pior. Você também pode impor um limite espacial. Todos estão presos em um lugar, por um ou outro motivo, e não podem contar com ajuda externa.

Em ambos os casos, é necessário deixar claro que os personagens vão ter de se virar com o que tem. Não há como conseguir recursos diferentes dos anotados em suas fichas, ou consegui-los vai demorar demais e tudo estará perdido antes que esses novos recursos cheguem.


O detalhamento do cenário e dos NPCs

Tendo limites espaciais, temporais e de recursos, tenha certeza que os personagens vão querer explorar ao máximo esses limites. Se a aventura acontece dentro de uma construção, é bem capaz deles fuçarem essa construção toda em busca de pistas e recursos. Por isso, detalhe o cenário muito bem. Detalhe as pistas muito bem.

Se durante todo o jogo, os personagens vão interagir com três NPCs importantes, esses personagens tem de ser indivíduos, e não fichas a serem derrotadas.

Não deixe pontas soltas, mas não exagere na quantidade de informações, para não correr o risco deles gastarem todo o tempo de jogo explorando o ambiente.


A preparação

O bom andamento de um jogo one-shot depende de uma extensiva preparação por parte do narrador:

  • quanto melhor você conhecer o sistema e o cenário, menos tempo vai perder consultando regras;
  • tenha em mãos, para você e para os jogadores, um guia rápido de consulta de regras, para evitar os livros;
  • prepare com antecedência todos os mapas, imagens e objetos que você irá precisar;
  • certifique-se que terá dados suficientes na mesa para agilizar as rolagens, pois é horrível ter de ficar caçando dados, é uma coisa que distrai os jogadores;
  • verifique com antecedência quais jogadores realmente irão ao jogo, e peça para que evitem atrasos, mas avisem caso for acontecer; um jeito meio sacana, mas que funciona bem, para inibir atrasos, é deixar claro que os jogadores escolherão os personagens por ordem de chegada;
  • pode parecer meio idiota mas, se seu grupo tem o costume de comer durante o jogo, ou mesmo fazer uma pausa para comer, providenciar os alimentos e água e refrigerantes com antecedência é essencial para evitar que alguém decida sair para comprar comida e com isso mantenha o jogo paralisado por muito tempo; mas obviamente essa dica de preparação depende do grupo e de onde está acontecendo o jogo.
a garrafinha de vidro era tubaína, não se assustem XD


Jogos testados e aprovados por mim para one-shots

A seguir uma listinha dos jogos que melhor funcionaram comigo, narrando em one-shot (não está em ordem):

Rastro de Cthulhu
Espírito do Século
Scion
Exalted
Marvel Heroic Roleplay Basic Game
Mutantes & Malfeitores
Hunter: the Reckoning

Não significa que outros não prestem, mas com esses eu consegui resultados melhores.


Espero que pelo menos parte dessas dicas seja útil. Algumas delas podem ser usadas também em campanhas ou em aventuras curtas.


3 comentários:

  1. muito bacana, adorei as dicas. e gostei de ver as props que vc fez pra Rastro

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  2. Eu tava devendo a foto desses props, mas não expliquei o que são pra não criar spoilers sobre a aventura ^^

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  3. Acrescentem Savage Worlds à lista

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